Benito Romero

Tudo que Benito fazia tinha o Brasil no meio, impossível desencarnar a pátria da sua alma. Hygino Schuler Vieira.

Recentemente perdi meu irmão de sangue. Agora perdi meu irmão de sonhos. No mínimo, umas 10 edições deste blog, e artigos, para mostrar aos que não o conheceram, quem foi Benito Romero, e sua importância para a colônia brasileira em Nova York, nos Estados Unidos, no mundo.

One of a kind

Benito Romero, mineiro de Nanuque, imigrante, empreendedor, empresário, sonhador, amigo, gentil, solidário. One of a kind. 53 anos de New York. Portanto, sobre ele, muitas histórias, invenções, mentiras, curiosidades.

Eu o conheci na loja da VARIG, térreo do Rockfeller Center, frente à catedral St. Patrick. Vindo de Moscou, contratado pela Delegacia do Tesouro Brasileiro, descia do 28 andar para ler o JB, O Globo, a revista Manchete.

Benito sabia cativar e influenciar pessoas para as suas ideias. Levou-me ao número 13 da Rua 46, pequena sala no térreo, sede da Brazilian American Society, criada por ele para sonhos maiores.

Eu vinha de experiências com jornal, textos, gráfica. E assim, o Brazilian American Bulletin circulou na base do “gilete press” de notícias dos jornais e revistas brasileiras lá da agencia da VARIG. O BAB, foi o berço do jornal The Brazilians que iniciei em dezembro de 1972, hasteando a primeira bandeira brasileira no centro de NY. Mudei o Z por S. Fui seguido pela Varig Brazilian Airlines.

Benito estava no seu Prime. Inglês fluente, sorriso bonito, sobrenome Romero, um belo rapaz latino-americano. Eu, brincando, o apresentava como “sobrinho de Cesar Romero”, famoso pelos filmes com Carmen Miranda.

O meu diploma de Direito Internacional, de Moscou, capital do comunismo, não me servia no dia a dia de New York, capital do capitalismo. Benito ensinou-me a caminhar e flutuar pela Quinta Avenida, onde você pode tropeçar com astros e estrelas do cinema, com personalidades mundiais.

A facilidade com que ele se aproximava de uma American girl, a fazia parar para ouvi-lo, era impressionante. Talibãs sexuais ainda não espalhavam contaminação alardeando “assédio” no sorriso, no elogio, no dar flores, no convite para um café, vinho, dançar, iniciar uma amizade, para conhecer o carnaval, o Rio de Janeiro.

Quando falávamos Brasil estavam implícitos: beleza do país, de pessoas, hospitalidade, boa música, gente alegre.

Eu, com roupas esquisitas, vindo do Russian way of Life, ficava mais tímido com a desenvoltura de Benito. Ele out. Eu in.

Ele seduzia, no bom sentido, ao ar livre, no charme, com brincadeiras. Meu forte sempre foi o “pé de ouvido”. Nesse tempo, enchíamos o apartamento dele de garotas, na Rua 47, a rua dos diamantes e pedras preciosas, entre a Quinta e a Sexta Avenida.

O não estar sozinho na Big Apple, a porta e a mão abertas de BR, acontecia aos domingos: “Tem festa lá no apê do Benito”. Gregas, espanholas, francesas, italianos, árabes, judeus, admiradores do Brasil. Não tinha esse negocio de Nós x Eles, diplomata, garçonete. Brasileiro? Entra.

Com tanta gente e samba rolando, o sindico parou a festa. Daí nasceu o Brazilian Sunday que eu e Peter Martins promovemos durante dois anos em discotecas da cidade. De onde nasceram a Ipanema discoteca, na Broadway, e a New York discoteca, em Ipanema, tremendo sucesso de Carlos Wattimo, a quem BR carinhosamente apelidou de General. (Carlos Wattimo era do exército USA). Na imagem, Peter Martins, no Brazilian Sunday que promovemos na Directoire, discoteca de franceses, na Terceira Avenida

São tantos momentos BR. Separei alguns:

Benito alugou um barco para celebrarmos a Independência do Brasil pela baia de Manhattan.Ele liderou comemoração à estátua de José Bonifácio de Andrada e Silva, no Parque da Biblioteca de New York onde plantou um pau-Brasil. (Seu último pedido: suas cinzas enterradas entre a arvore e a estátua).

O primeiro “Brazilian Day”

Foi com a vitória da seleção brasileira no México. O navio-escola Almirante Tamandaré estava ancorado no píer da 46. E lá foi BR convencer o Comandante a liberar a banda de música para o Madison Square Garden.

Pela primeira vez, um jogo de futebol foi transmitido via satélite. Iniciativa do meu amigo Ivan Egas, do Canal 41. Entrei no bolão para pagar o satélite com 2 mil dólares, sai com 2.650.

Mesmo com a lábia de Benito não conseguimos a banda toda. Mas, levamos 2 sopros, e três na percussão. O rancho por nossa conta, saiu de graça, na Cabana Carioca, do saudoso Américo Torneiro.

Difícil encontrar bandeira do Brasil em NY. Benito convenceu uma funcionária de repartição brasileira, e levamos duas bandeiras.

O Madison Square Garden até a tampa de italianos. Os mexicanos, latinos em geral, torciam pelo Brasil. Vencemos a Itália. Brasil Tri Campeão do Mundo! E aí, aonde ir, o que fazer, com tanta alegria e orgulho de ser brasileiro?

Músicos de rua se juntavam à nossa charanga. BR subiu num carro gritando Viva o Brasil. Viva o Brasil. Vamos para a Rua 46, a Brazilian Street (pela primeira vez, ouvimos esse título. 26 anos depois, a Prefeitura de NY colocou a placa da Little Brazil, Rua 46 com Quinta Avenida).

A multidão crescia em frente a Macy’s. Ícone nova-iorquino, não poderia ter a entrada bloqueada. Veio a Polícia Montada. Cercou todo mundo. Papo não funcionaria com os homenzarrões a cavalos. Apelamos para Mariana, Ritinha, Mila, Sandra, nossas queridas Go- Go Girls nos clubes da Broadway.

Bonitas, charmosas, corajosas, elas dominaram a cavalaria. “Ganhamos a Copa do Mundo, é festa brasileira, vocês são nossos convidados, vamos à Rua 46, sem confusão”.

Unbelivable. Me emociono sempre a lembrar esse dia do nosso “primeiro Brazilian Day”. Polícia Montada de NY escoltando a bandeira do Brasil, a charanga, as nossas garotas, nós todos, na maior alegria, até a Rua 46, na qual, Benito e eu, dedicamos a maior parte de nossas vidas. Qual bundão ou bundona de nossa política suja recebeu tal privilégio?!!

Vivemos, pelo mundo, momentos maravilhosos com gente admirada, fascinada, curiosa, com o Brasil que eles “descobriam- descobrem” conosco. Que maldição Ó Jesus, Ó Alá, Ó Xangô, de termos um país tão rico e bonito, com políticos e governantes tão feios, bandidos, corruptos..

Carnaval com Donald Trump termina em pancadaria

Nair Mesquita, funcionária do Consulado Geral, foi a pioneira do carnaval brasileiro em NY. Restrito aos funcionários, militares, empresários, em visita a cidade. Acontecia em cobertura na Segunda Avenida. Graças as reuniões da Associação de Brasileiros de Da. Nair parei de sentir-me sozinho. Enturmei. Tive amores. Criei coragem para encarar NY. Do berço de Da. Nair nasceram os carnavais brasileiros in the USA. Foi minha homenageada no Carnaval do Brasil–Waldorf Astoria.

Soubemos que o jovem empreendedor Donald Trump comprara o hotel Commodore na Rua 42  (Grand Hyatt) e queria promover eventos para atrair clientela cativa. E lá foi BR convencer- quem diria!!!, o futuro presidente dos Estados Unidos, abrir o salão de festas do hotel para um baile de carnaval. Rolava tudo bem.

Dois brasileiros começaram a pancadaria. Copos, garrafas, cadeiras, mesas, quebradas. Veio a Polícia. O baile acabou em prejuízo. Passamos ano e meio pagando a conta para Donald Trump.

Natal em Família: Benito foi pioneiro dos voos fretados (passagens mais baratas). Criou a BACC- Brazilian American Cultural Center- pela qual promoveu Natal em Família com voos charters para o Brasil. Ele adorava vestir-se de Papai Noel, viajar no meio dos passageiros, tocando a sua gaita.

A Casa do Brasil

A viúva pedia 80 mil dólares pelo prédio de quatro andares no 37 West da Rua 46, onde fiquei 10 anos. O sonho de Benito Romero parecia se concretizar. Juntando empréstimos, chegamos a 30 mil dólares.

BR convenceu Mrs. Jacobson a vender por 70 mil dólares. Imaginem prédio entre a Quinta e a Sexta, filé mignon de NY, por 70 mil dólares! (Hoje, a Casa do Brasil, tería patrimônio de 20 milhões de dólares, ou mais).

E lá fomos nós pedir empréstimo, investimento, ajuda, para Lino Otto Bohn, gerente da inaugurada agência do Banco do Brasil na Quinta Avenida (prédio próprio). Nem um centavo.

Benito ficou tunado na construção da Casa do Brasil. Passou a viver exclusivamente para ela. Dedicou milhares de horas atendendo, orientando imigrantes, visitantes, exposições, eventos culturais, pagando aluguel e despesas administrativas. ( 1. BR, ilustração de Victor Hugo, artista plástico de Cuiabá, MT).

Negligenciou seus negócios de passagens aéreas, fretamentos, turismo. Passou a viver de seu sonho maior, levando-o ao extremo de negligenciar a própria saúde.

Foi o nosso D. Quixote”: diz Edilberto Mendes, por muitos anos, meu editor no jornal The Brasilians e organizador do Brazilian Day, já sob a administração de João de Matos em associação com a TV Globo. João de Matos dirigia táxi em Miami. Chegou em NY, conheceu BR que lhe acolheu, deu guarida, apoio, orientação. JM ficou milionário na Rua 46, com venda de passagens aéreas, câmbio de dólar, churrascaria.

A Casa do Brasil em New York só seria- será possível se o governo ou empresa ou empresário benemérito (coisa rara no Brasil, e abundante nos EEUU) baterem o martelo.

No exterior, nossos políticos e governantes adoram subir em palcos, aparecer em coquetéis, exposições, “matar saudade (de uma semana distante) tomando cafezinho com bolo de queijo, comendo arroz com feijão em restaurante brasileiro.

Fazem lobby para fazer palestras, serem “homenageados”, de olho nas imagens enviadas ao Brasil.(O que fez Dilma, na presidência, pela Casa do Brasil NY e projetos de brasileiros, mundo afora?? Mas, fez doações, perdoou dividas, comprou a refinaria- sucata em Pasadena. Fez cara de paisagem com a corrupção na Petrobras, quando presidente do Conselho de Administração da empresa, e na cadeira de Presidenta do Brasil. Ela fez alguma doação pessoal à Casa do Brasil em sua viagem a NY?? Mas, a imagem dela com BR foi divulgada no Brasil. “Dilma prestigia brasileiros em NY”.

    Cansado dessa bullshit, criticado pela Direita por ter estudado em Moscou, criticado pela Esquerda por ter ido para New York, nunca convidei político para subir ao palco do Brazilian Day.

Agora com tanta corrupção brotando da lama e sujando mais ainda a imagem do Brasil, peço aos organizadores de Brazilian Day e eventos da comunidade: não abram espaço para essa gente. Não nos apoiam. Nos usam. Quarentena neles!

Money Maker

Todos da nossa geração Rua 46 se deram bem. Alguns, com milhões de dólares. Mas, Benito nunca foi um Money Maker. Sempre viveu na linha do necessário. Nos últimos 25 anos, o pouco que conseguia, ele colocava na caixinha dourada de seu sonho bonito: manter a Casa do Brasil.

Votar no exterior

Por um sonho que não deveria ter tido, regressei ao Brasil. No governo de Mato Grosso fiz lobby junto a Ulysses Guimarães, Tancredo Neves, contei com o apoio do senador Marcio Lacerda, para que constasse na nova Constituição o direito de brasileiro, no exterior, votar e ser votado.

Benito batalhou por esse sonho, há muito concretizado por italianos, portugueses, gregos. Hoje, no exterior, votamos nas eleições presidenciais do Brasil. É pouco. Devemos eleger representantes à Câmara e ao Senado.

Na sua generosidade BR telefonava na madrugada, ficávamos horas conversando. Ele insistia na minha candidatura. Quando ele sim, seria o melhor de nossos representantes.

 Benito Romero é linha divisória entre o Brasil que sonhou e o Brasil que embruteceu. O Brasil cordial e o Brasil grosseiro. O Brasil da banda boa e da banda apodrecida por políticos e governantes. Benito morreu sonhando com o Brasil bonito. Eu morrerei sangrando com o Brasil feio. 1. Primeiro programa de TV promovendo o Carnaval. 2. Benito sempre alto astral, light, chapéu de couro nordestino, centro, com Peter Martins e Francisco de Matos.

Não é preciso ter conhecido Benito Romero. Basta saber que com seu trabalho em New York, tambor do mundo, ele conseguiu dos nossos governantes- e de outros países- melhor tratamento aos imigrantes brasileiros, mundo afora.

(Sempre que eu pedia, BR atendia artistas e eventos de Cuiabá. Tentei um recurso mínimo do governo de MT e do Ministério do Turismo para a Casa do Brasil continuar promovendo nossa cultura e seus artistas nos Estados Unidos. “Fica difícil uma verba para o exterior”. Mas, os filho e filhas da puta, roubaram e mandaram bilhões para o exterior!

A gente sai do Brasil, mas, o Brasil não sai da gente. Com Benito Romero na memória, todo dia é Brazilian Day!

Trilha sonora:https://youtu.be/nhEkDNM75kE?list=RDnhEkDNM75kE

Tem histórias de Benito Romero? Histórias de brasileiros batalhando no exterior, mantendo a boa imagem do Brasil? Envie texto, imagens, mensagens, para: diadobrasil1@gmail.com. Divulgue. Encaminhe: www.diadobrasil.com.br